O FUTURO DOS OUTROS NAS NOSSAS MÃOS


A Revolução Industrial (e exponencialmente após a Segunda Revolução Industrial e a Primeira Guerra Mundial) trouxe às cidades europeias uma febre de rápido desenvolvimento e de construção racionalista que arrasaram, sem grande reflexão e até ao último quartel do século XX, a cidade histórica. Havendo potencial de lucro ou de algum tipo de vantagem, o velho foi varrido.

No entanto, terminado esse período de crescimento acelerado, as cidades foram descobrindo o valor que esses espaços antes destruídos têm ao serviço do consumo cultural, do turismo e das indústrias do lazer. Em consequência, tenta-se reconstruir (com grande despesa e imitações de pouco sucesso) tudo o que foi alegremente destruído antes.

O que foi dispensável é agora objeto de adoração, o que era banal é hoje considerado rara obra de arte.


Depois da destruição causada pela Segunda Guerra Mundial (e, talvez ainda pior, da destruição causada pelo urbanismo utópico mas pouco cultivado das décadas seguintes), não é surpreendente que a reabilitação de edifícios antigos, mesmo daqueles com menos mérito, tenha tido um impulso crescente que prossegue ainda hoje. Mas este contraste duro entre o passado que recuperamos e presente que o ofende é um fenómeno excecional, pouco natural e, em muitas medidas, inadequado.

As grandes obras que nos chegam do passado -catedrais, palácios, estruturas de defesa e outras grandes obras civis- são invariavelmente um palimpsesto onde cada sucessivo arquiteto intervinha com peças desenhadas à sua maneira e à maneira do seu tempo, integrando-as na obra anterior e preparando a sua para aceitar os trabalhos vindouros.

Este conflito entre passado e presente pode, portanto, ser substituído por uma abordagem mais criativa, que funde ambos os tempos para o futuro, no mesmo contínuo ininterrupto que foi formando as nossas cidades milenares.


Não queremos que as nossas cidades sejam um somatório de peças desconexas: as cidades são o legado das gerações que as habitam para o futuro; são o maior manancial de significado, informação e história que a humanidade transporta consigo.